Vamos falar de Diabetes Mellitus

Vamos falar de Diabetes Mellitus

A Diabetes Mellitus é uma doença crónica que se caracteriza pela incapacidade do organismo de produzir ou responder adequadamente à insulina, o que se traduz num nível anormalmente elevado de glicose no sangue.

Cientificamente é utilizado o nome completo da doença diabetes mellitus, ao invés de apenas diabetes, como forma de distinção com a “diabetes insipidus”, uma outra doença mais rara, semelhante à diabetes mellitus. Neste artigo, sempre que for referida a doença diabetes estaremos a referir-nos à diabetes mellitus.

GLICOSE

A glicose (o açúcar presente no sangue) é a principal fonte de energia usada pelo nosso organismo e é vital para o normal funcionamento dos nossos órgãos e tecidos. Mas, para que este açúcar possa ser processado pelo organismo, ele tem de ser transportado desde o sangue até ao interior das nossas células e é aqui que entra a insulina.

INSULINA

A insulina é uma hormona produzida no pâncreas (mesmo até antes de nascermos) e é a principal responsável por “retirar” o açúcar presente no sangue (glicose) e transportá-lo para o interior das células, baixando assim a concentração de glicose no sangue. Ela é a principal reguladora do nosso nível de glicemia. A glicemia é o termo que utilizamos quando nos referimos à quantidade de açúcar no sangue.

DIABETES

Quando alguém sofre de diabetes, assistimos a um conjunto de distúrbios metabólicos que resultam na subida anormal e descontrolada dos níveis de glicose no sangue (hiperglicemia) que podem ter dois motivos:

  • ou por problemas com a produção de insulina;
  • ou por problemas na actuação da insulina no transporte da glicose do sangue para as células, ao que se dá o nome de “resistência à insulina”.

É a combinação entre elevados níveis de glicose no sangue e baixos níveis de glicose nas células que resulta nos sintomas e complicações da diabetes.

Esta doença crónica está em franca expansão no mundo industrializado, sendo que em Portugal, segundo o Observatório Nacional de Diabetes, cerca de 40,7% da população sofre de pré-diabetes ou diabetes. Esta é uma das doenças mais comuns no mundo e a sua principal causa está associada à má alimentação e à obesidade.

São vários os tipos e causas da diabetes (pré-diabetes, diabetes tipo 1, diabetes tipo 2 e diabetes gestacional), no entanto, todos apresentam geralmente o mesmo tipo de complicações, sendo as mais comuns as lesões nos vasos sanguíneos, nos rins e nos olhos, neuropatia e neuropatia periférica, bem como maior predisposição a infecções. A maior causa de mortalidade provocada pela diabetes continua, no entanto, a ser a doença cardíaca.

Pré-Diabetes

A fase inicial da diabetes é denominada de pré-diabetes. É em tudo semelhante à diabetes, no sentido em que os níveis de glicemia são superiores aos normais, mas ainda não suficientemente altos para obter a classificação de diabetes.

Esta “fase”, deve ser encarada com a maior seriedade pois é um sinal de alerta do corpo de que estará prestes a desenvolver diabetes tipo 2 e, consequentemente, as complicações médicas derivadas da doença. No entanto, esta é uma fase essencial para se iniciar um tratamento, uma vez que ainda é completamente reversível, ao contrário da diabetes tipo 2.

Dado que a prevalência de diabetes se encontra em franca expansão em todo o mundo, e uma vez que na sua fase inicial não são muito expressivos os seus sintomas, recomenda-se o rastreio da doença na população em risco de desenvolver diabetes tipo 2, em todas as pessoas com:

  • mais de 45 anos
  • excesso de peso ou obesidade e perímetro abdominal (no homem ≥64cm e na mulher ≥80cm)
  • estilo de vida sedentário
  • história familiar de diabetes
  • diabetes gestacional prévia
  • historial de doença cardiovascular
  • hipertensão arterial ou colesterol alto
  • consumo de fármacos que predisponham à diabetes

Diabetes Mellitus tipo 1

A diabetes tipo 1 é uma doença crónica autoimune, que se caracteriza pela quase total ou completa incapacidade de o pâncreas produzir insulina, pelo que a única resposta possível a esta doença é administração regular de insulina. Mais comum de ser desenvolvida em crianças, adolescentes ou jovens adultos, pode também, no entanto, desenvolver-se em adultos ou idosos. É uma das doenças mais comuns no mundo, sendo que em Portugal afeta cerca de 1 milhão de pessoas.

Uma vez que o pâncreas deixa de produzir insulina, o organismo já não possui a sua “ferramenta” para efetuar o transporte do açúcar desde o sangue até ao interior das células, o que resulta numa subida anormal e descontrolada dos níveis de glicemia. Nesta doença autoimune, é o próprio organismo que destrói as células que produzem a hormona insulina. Não se conhecem ao certo os motivos que levam a esta reacção anormal do corpo, apontando-se por vezes a combinação de factores como características genéticas e determinados estímulos ambientais, como por exemplo infeções, como a fonte do problema.

SINTOMAS

Sendo esta uma doença autoimune que surge geralmente nos períodos iniciais de vida, os sintomas costumam surgir de forma muito rápida. Podem, no entanto, demorar mais tempo e surgir apenas na adolescência ou início da vida adulta.

Os sintomas habituais associados à elevada glicose e presentes em todos os tipos de diabetes são a sede e fome excessivas, associadas a um aumento da frequência urinária.

No entanto, na diabetes tipo 1 pode ocorrer um quadro clínico grave e potencialmente fatal, a chamada cetoacidose diabética, na qual o organismo produz ácido em excesso e os seus sintomas iniciais são náuseas, vómitos, fadiga e dor abdominal, especialmente em crianças. Se não for tratado pode resultar em coma ou mesmo morte.

Diabetes Mellitus tipo 2

Ainda que influenciada por fatores genéticos, a diabetes tipo 2 é geralmente desenvolvida devido a fatores de estilo de vida e má alimentação. Este é o tipo mais comum da doença, sendo que em cada 10 diabéticos, 9 sofrem de diabetes tipo 2. Pode surgir em qualquer idade, mais é mais comum em adultos que apresentem excesso de peso. É geralmente o “segundo estágio” da pré-diabetes.

A diabetes tipo 2 é caracterizada por duas situações, por um lado o pâncreas diminui anormal e progressivamente a produção de insulina e, por outro lado, há uma perda progressiva da eficácia dessa mesma insulina (a chamada “resistência à insulina”). A junção destas duas causas leva a que se assista a um aumento anormal e descontrolado dos níveis de glicemia.

Segundo o conhecimento actual, a sequência de acontecimentos que levam à diabetes tipo 2 é a seguinte:

  1. Através do resultado entre um estilo de vida sedentário, má alimentação e factores genéticos, o nosso organismo começa a criar uma resistência à insulina, fazendo com que esta perca progressivamente o seu efeito;
  2. Como forma de compensação, o pâncreas aumenta a sua produção de insulina e mantém assim, durante algum tempo, os níveis de glicemia controlados;
  3. Em certas pessoas (não se sabe ao certo o porquê), este aumento de produção de insulina faz com que o pâncreas comece a falhar e a deixar de produzir a insulina suficiente para compensar a resistência à insulina e manter a glicemia controlada.
  4. Assim que o pâncreas não consegue suportar o aumento de produção, assistimos a uma subida anormal e descontrolada da glicemia e surge a diabetes mellitus tipo 2.

Ainda que não se tenha certezas quanto às razões que levam à falha do pâncreas em certas pessoas, a realidade é que existem factores de risco aos quais podemos e devemos estar atentos como forma de prevenção contra o desenvolvimento de diabetes tipo 2: excesso de peso, diminuição de atividade física e aumento de gordura (especialmente a abdominal) são fatores que sabemos estar ligados à resistência à insulina e que podem levar ou agravar a diabetes tipo 2.

Com o passar dos anos, o paciente com diabetes tipo 2 geralmente começa a necessitar de administrar insulina, pois o pâncreas deixa de produzir insulina por completo.

SINTOMAS

Devemos ter em atenção os sintomas progressivos e subtis da doença, de modo a que o diagnóstico seja feito atempadamente e o tratamento iniciado assim que possível. Diagnosticar a doença de forma precoce pode, no entanto, ser complicado dado que os sintomas podem ficar escondidos durante anos ou mesmo décadas.

Entre os sintomas mais comuns e que devem criar preocupação são os sintomas que estão diretamente associados ao aumento da glicose no sangue:

  • aumento da frequência urinária – que resulta da tentativa dos rins de filtrar e eliminar o excesso de açúcar no sangue através da urina
  • aumento da sede – esta é causada pelos elevados níveis de açúcar no sangue e pelo aumento da frequência urinária
  • aumento da fome – dado que na urina é eliminado um excesso de calorias, o corpo reage “ficando” com fome
  • cansaço ou fraqueza – associado à desidratação provocada pelo aumento da frequência urinária
  • visão turva – o aumento da glicose pode originar uma infiltração de um fluido nos olhos

Diabetes Gestacional

Durante o processo de gravidez, por vezes, surge um tipo de diabetes ao qual damos o nome de diabetes gestacional. Este distúrbio desaparece após o parto e deve-se principalmente devido ao facto de que durante a gravidez, o corpo da mulher coloca em primeiro lugar o desenvolvimento do feto em detrimento do seu próprio bem-estar. Ou seja, na gravidez, toda a ingestão de alimentos por parte da mulher irá ser repartida com o feto.

De facto, em alguns casos, toda a glicose e aminoácidos são encaminhados em exclusivo para o feto, privando a mãe desses nutrientes, ficando o funcionamento do metabolismo da mãe assegurado à base de ácidos gordos. O resultado é um estado alterado dos níveis de glicemia nas grávidas que, em jejum passam por um estado de hipoglicemia (baixo açúcar no sangue) e após as refeições o oposto, um estado de hiperglicemia (elevados níveis de açúcar no sangue).

Se o quadro clínico da mãe se mantiver após o parto, ou seja, se os seus valores não voltarem ao normal, então estaremos perante um caso de diabetes tipo 2 que estava “mascarado” de diabetes gestacional.

As grávidas que tenham passado por um período de diabetes gestacional, correm um maior risco de vir a desenvolver diabetes tipo 2 no futuro, pelo que devem ser acompanhadas cuidadosa e regularmente por um médico ao longo da sua vida.

SINTOMAS

Na realidade, este é um distúrbio que não apresenta sintomas óbvios. Por este motivo, todas as grávidas devem fazer várias análises de rotina ao sangue de modo a detetar níveis anormais de glicemia, desde o início da gestação.

Outra medida que deve ser tomada, por todas as grávidas que não tenham acusado nas análises indícios ou sido diagnosticadas com diabetes gestacional ou diabetes tipo 2, é a ingestão de uma solução oral de glicose (a chamada Prova de Tolerância à Glicose Oral – PTGO), entre a 24ª e a 28ª semanas de gestação. Ao ingerir esta solução sobrecarregada de açúcar diluído em água, os médicos são capazes de medir os níveis de glicemia em 3 recolhas de sangue separadas (às 0, 1 e 2 horas após a ingestão).

De modo a prevenir o desenvolvimento de diabetes gestacional, aconselha-se às grávidas que comam várias vezes ao dia e em quantidades moderadas, facilitando assim a digestão e de modo a evitar a sensação de azia ou enfartamento. E ainda que não se privem de ingerir hidratos de carbono (pão, massas, arroz), devendo optar pelas versões mais saudáveis dos mesmos, nomeadamente as integrais e completas.

Uma vez diagnosticada com diabetes gestacional, é altamente recomendável que a grávida efetue medições regulares dos seus níveis de glicemia junto do profissional de saúde destacado para o acompanhamento da sua gravidez. Deste modo, ao repetir a análise de tempo a tempo, o profissional de saúde consegue obter uma avaliação fidedigna da evolução dos valores. Se necessário, através da avaliação destes valores, pode ser sugerido à grávida que efetue alterações na sua dieta ou até mesmo que inicie a toma de medicação.

O importante é que os níveis de glicemia estejam controlados, para o bem da saúde da mãe e do bebé ainda por nascer.

Após o parto, entre a 6ª a 8ª semana, é efetuado uma nova PTGO à mãe. Nesse exame, o médico conseguirá perceber, se os níveis de glicemia não tiverem baixado, que a paciente sofre na realidade de diabetes tipo 2, uma vez que a diabetes gestacional retrocede após o parto.

Se a mãe apresentar sinais de sofrer de diabetes tipo 2, antes ou após o parto, é importante que o bebé seja também submetido a análises e exames de modo a que se possa detectar se o seu sistema consegue regular eficazmente os níveis de açúcar no sangue.

Complicações da Diabetes

A parte do corpo mais afetada pela diabetes é o sistema sanguíneo. Através do estreitamento dos vasos capilares, o fluxo de sangue fica limitado, o que origina um conjunto de possíveis complicações em diversos órgãos, tais como:

  • cérebro – possibilidade de rompimento dos vasos sanguíneos do cérebro originando um AVC
  • olhos – possibilidade de cegueira (retinopatia diabética)
  • coração – possibilidade de causar um ataque cardíaco
  • rins – possibilidade de causar doença renal crónica (nefropatia diabética)
  • nervos – diminuição da sensibilidade nas extremidades, com maior incidência nos pés (neuropatia diabética)

O aumento dos níveis de glicemia é ainda responsável por aumentar a susceptibilidade do organismo a infeções bacterianas e fúngicas.

Tratamento

Nos dias de hoje, as pessoas diagnosticadas com diabetes mellitus têm à sua disposição todas as ferramentas para conseguir controlar a doença e prolongar a sua vida, ainda que a mesma não tenha cura.

O objectivo principal do tratamento da diabetes é o controlo dos níveis de glicemia, de modo a reduzir a probabilidade de desenvolvimento das complicações associadas à doença. É assim imperativo que o paciente obtenha um diagnóstico atempado do seu tipo de diabetes, podendo assim ser iniciado o tratamento adequado à sua condição.

Como foi referido, a diabetes tipo 1 é uma doença crónica autoimune, para a qual não há cura nem medidas preventivas que possam ser tomadas. Mas pode e deve ser controlada, através da administração de injeções de insulina e da adopção de medidas de controlo, de modo a evitar as complicações mais severas associadas à doença.

No caso da diabetes tipo 2, assim que se instala também não tem cura. No entanto, pode e deve também ser controlada com as mesmas medidas recomendadas para a diabetes tipo 1.

As medidas de prevenção devem ser adoptadas, idealmente desde sempre, ou seja, não devemos esperar até um estado de pré-diabetes para que seja iniciado o processo de prevenção. No entanto, mesmo se nos encontrarmos nessa fase da doença, esta ainda pode ser geralmente revertida com recurso somente a alterações no estilo de vida.

Os maiores aliados na prevenção da diabetes tipo 2, bem como na reversão da pré-diabetes, são efetivamente as alterações do estilo de vida.

Através de uma alteração na dieta focada em alimentos saudáveis aliada à prática regular de exercício físico, podemos combater um dos maiores fatores de risco para o desenvolvimento da doença e surgimento de complicações, o excesso de peso e a obesidade. É amplamente aconselhado a todos os pacientes que deixem de fumar e que reduzam ao máximo a ingestão de bebidas alcoólicas.

Estudos comprovam que apenas com a redução de peso corporal entre 5 e 10% (em pessoas com excesso de peso), é possível diminuir o risco de desenvolver diabetes para metade.

A atividade física é uma forma eficaz de prevenir complicações da diabetes e de controlar os níveis de glicemia, pois vai estimular a produção de insulina e facilitar o seu transporte para as células. Além disso, a atividade física vai melhorar a sua condição cardiovascular geral.

Assim, as medidas de prevenção e/ou controlo para as diabetes tipo 1 e tipo 2 devem, sempre que possível, incluir:

  • a prática de exercício físico regular e a promoção de um estilo de vida activo;
  • a opção por uma dieta equilibrada em termos de contagem de calorias e na qualidade dos alimentos;
  • se necessário, procurar perder peso e gordura localizada com especial foco na gordura abdominal;
  • deixar de fumar e reduzir substancialmente o consumo de bebidas alcoólicas;
  • a redução da pressão arterial e regulação dos níveis de colesterol;
  • a realização de exames oftálmicos de rotina;
  • o cuidado com a higiene oral e da saúde dentária;
  • se necessário, iniciar a terapêutica com insulinoterapia.

Felizmente, é hoje em dia possível viver uma vida longa e confortável enquanto doente de diabetes, desde que cumpridas as recomendações de mudança de estilo de vida e seguida a medicação prescrita pelo médico.

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